quarta-feira, 28 de março de 2012

Saudades do antigamente

Dantes ia ao cinema aqui no Porto. Na cidade.
Ou melhor no Cidade, shopping center construído com polémica, mas que se tornou rapidamente um local de convívio no coração da cidade, junto à Rotunda da Boavista, onde vão jovens e velhos, turistas, estudantes,mães de família como eu outrora, executivos, toda a espécie de "povo".



É um local bonito, em tons de azul ( tinha de ser) e que dantes - não há muito tempo - oferecia 4 filmes de tarde e à noite, todos independentes, em cinemas acolhedores, confortáveis e seguros. Não havia pipocas, mas à volta, a Praça da Alimentação estava sempre cheia, com gastronomia da mais variada. A comida manteve-se, os cinemas fecharam. Sintomático.
Não precisamos de encher a cabeça de ideias, nem de nos evadirmos para o país dos sonhos, mas é necessário continuar a encher o estômago de hamburgers, massa chinesa ou sopa de Pedra.Em breve esta cidade só terá lojas de alimentos, mercearias, supermercados, restaurantes, cafés e.....telemóveis e bancos, claro.
Cinemas, não.

Vi filmes fantásticos nesses 4 cinemas. Ainda lá estão os restos, pois o espaço não serviu para mais nada, nem sequer aproveitaram a sala maior que poderia ser um teatro ou sala de concertos. Um desperdício.
Passei a ir comer à Arcádia dentro da Livraria Leitura, onde se pode sentar e folhear os livros da moda , centenas de exemplares que todo o bicho-careta hoje consegue publicar, não sei com que fim e para que público-alvo. Ficção, não ficção, poesia, infanto-juvenil, jurídicos, bricolage, saúde, alguns de Arte, o diabo a 4. Não falta que ler...e não faltarão os leitores?
As lojas de CDs estão todas a fechar. Já não se vende música, pirateia-se o que se quer ou compra-se pela net. Lojas como a Melody sempre com uma escolha maravilhosa de música clássica, onde comprei raridades para flauta, um dos instrumentos que o meu filho e nora tocam. Já não resta nada. Lojas de roupa cada vez mais caras como a Throttleman e a Mango sobrevivem não sei como. É o franchise!:))

Vim um pouco nostálgica. Deve ser da idade, as boas memórias do passado são muitas e as más apagam-se.

Em casa oiço no Mezzo a Madama Butterfly, com Placido Domingo e Mirella Freni, que me faz sempre chorar...contava o meu Avô que tinha pedido namoro à minha Avó durante uma récita desta ópera no Coliseu de Lisboa.Que a música o tinha inspirado. Ela era linda e 17 anos mais nova, ainda prima afastada dele. Puccini acompanhou-os toda a vida. A música e o sofrimento expresso nesta ópera transcende-me. Plangente.

Ironica e dramaticamente, não consigo deixar de associar a morte dalguns locais desta cidade ao hara-kiri da minha querida Butterfly, que tudo perde no final trágico da sua curta vida.