sábado, 17 de julho de 2010

Há livrarias que não deviam morrer...( in memoriam da Borders, UK)


Sempre adorei livrarias, mesmo quando não tinha dinheiro para comprar mais do que o jornal Letras e Artes, mas namorava tudo o que é livro, sobretudo os estrangeiros, franceses e ingleses, não por falta de patriotismo, mas porque desde pequena que as duas línguas eram para mim perfeitamente claras e havia muito mais diversidade de literatura à venda. Quando era criança, fui muitas vezes à saudosa Ática, na Rua Alexandre Herculano, que ficava por baixo do consultório do meu Pai e que pertencia á minha Madrinha. Que sorte, dirão os leitores deste blogue. Era mesmo, mas não aproveitei o suficiente. Nos dias dos meus anos, a senhora, que é francesa, casada com um primo direito da minha Mãe, dizia-me, persuasiva no seu sotaque de rrs rolados: " Minha querrida filha, vai à Ática e escolhe uns livrrros que queirrrras lerrr".
Não me esqueço da sensação estranha que era entrar naquela loja cheia a abarrotar de livros lindos e escolher algum para mim. O empregado cheio de mesuras e eu petrificada perante a responsabilidade. Lembro-me de, uma vez, com uns 4-5 anos, ter escolhido um livro daqueles em que se abrem as páginas e elas são todas recortadas de modo a formar uma imagem em três dimensões dum castelo, de fadas ou anões. Nessa altura não havia em lado nenhum livros desses, como há agora. Era lindo com salpicos dourados e prateados a cair da varinha de condão da fada.Nunca mais o esqueci.
Noutras alturas, desapontei a minha madrinha seriamente pois escolhi livros dos CINCO, que eu adorava e lia várias vezes de fio a pavio, às vezes até a meias com as minhas irmãs, acabados de sair da editorial DN. Ela achava que os livros eram pechincha demais para serem prenda de anos e acabava por me dar outra coisa mais categorizada. Se eu soubesse teria pedido a colecção toda do Fernando Pessoa ou da Sophia, editados pela Ática.Mas só tinha uns dez anos.
Outras livrarias que fazem parte do meu imaginário são a Buchholz, na Rua Castilho - ou lá perto - onde passava horas esquecidas sentada ou ajoelhada no chão a folhear os livros que eles tinham em montes espalhados, já que as prateleiras estavam cheias. No meio de toda a literatura alemã, ainda encontrava os meus queridos Livres de Poche, gordinhos e com capa muito colorida. Li inúmeras obras inglesas ou americanas em francês pois gostava muito mais dos Livros de Poche do que dos da Penguin, com letra demasiado pequena e muito densos. Para ler os clássicos alemães, comprei muitos da colecção Aubier, que tinham do lado esquerdo a versão francesa e do lado direito a alemã, o que tornava a leitura bem mais acessível. Schiller, Lessing, Goethe e outros, foi quase tudo lido nessas edições bilingues e muito caras. Ia-se a minha mesada num ápice e o meu Pai não era muito generoso. A minha Madrinha, nessa altura, já não me oferecia livros....:)

Aqui no Porto, tinha uma livraria de estimação, mas que não ficava muito à mão: a Leitura, na Rua de Ceuta.. Agora já há uma no shopping Cidade do Porto que é muito agradável. Perto ficava a Livraria Britânica, especializada em livros dessa nacionalidade. Muito dinheiro lá gastei para o ensino... ainda agora me pergunto se valeu a pena. Como já trabalhava para a Porto Editora, comprava muito, tudo o que saía de novo, até vídeos e cassetes: As Mulherzinhas, Adrian Mole, O Diário de Anne Frank, Os Cinco, tenho tudo em cassete e agora já nem há leitores desses. Os meus alunos não apreciavam o espólio que eu levava para as aulas, achavam tudo muito difícil e , afinal, estava a dar-lhes de mão beijada aquilo que custava uma fortuna.
Há meses fui a Leeds com a minha filha e tive um dos maiores desgostos da minha vida. Saímos na Headrow - rua principal da baixa - e fomos direitas à Livraria Borders, local de culto da minha filha e um dos meus tb por afinidade. Qual não é o nosso espanto quando vimos que a Livraria estava fechada já desde Novembro de 2009. Os vidros sujos, uma papeleta a avisar do encerramento, mais nada. Quase chorei. A Borders era a melhor e mais mística livraria que conheci. Igual ou parecida só a Harvard Bookstore em Boston. Espaçosa, aberta, cheia de cantos e recantos onde nos podíamos sentar e apreciar as obras, ouvir toda a espécie de música com headphones, um stand de revistas com tudo o que há sobre tudo o que acontece, um Starbucks Café, igualzinho aos americanos, com shortbread , cookies e brownies, chás de toda a espécie e um ambiente mágico. Podiam-se lá passar tardes e noites - fechava às 11 pm - e até não comprar nada. De vez em quando iam lá escritores como Paul Auster, Roger McGough ou Yasmina Reza fazer pequenas lectures.
Li no Guardian que a Borders foi á falência, devido à concorrencia da Amazon e outra livrarias online. Um desastre irreparável.
Lá fomos à Waterstones, que é agora a rainha das livrarias, mas não é a mesma coisa. Nem poderia ser.


Espero que esta Entrada não pareça uma panóplia de nomes que nada vos dizem ou, mais grave ainda, expressão de vaidade ou show off. Estou muito comovida ( e um pouco revoltada) ao escrever estas memórias e ao relembrar tantos momentos belos que locais simples como uma livraria podem oferecer aos seus visitantes.

É um crime fechar cinemas como os quatro do shopping Cidade do Porto - Medeia -, encerrados há menos de um mês. Também não se deviam fechar livrarias ou cafés que têm uma história. Essa história é culto e património duma cidade. Ninguém fecha igrejas por falta de visitantes.

sexta-feira, 16 de julho de 2010

VENEZA...no ano 2000




Estive lá nesse ano, em Fevereiro, no Carnaval. Fortuitamente... uma surpresa do meu filho que se ia casar daí a uns meses e que vivia em Munique. Apanhámos o comboio em Innsbruck e dentro de cinco horas estávamos em Veneza, a abarrotar de gente, máscaras,papafogos, saltimbancos, doges e princesas...um sonho, que esta pintura procurou traduzir pois foi inspirada numa foto tirada por mim com uma máquina das antigas, uma Canon EOS 50, no LIDO, com a vista para a cidade.

Sei que a canção de Charles Aznavour é muito triste, mas coloco-a aqui, pois é para mim uma das mais belas canções dele. E também glorifica a cidade.

O vídeo é uma homenagem ao Carnaval e à pintura. Não poderia ser melhor.

quinta-feira, 15 de julho de 2010

UTOPIA transformada em REALIDADE



Está-se a aproximar o fim do ano. E com ele vem uma certa nostalgia que o verão sempre tráz consigo. Algumas pessoas já partiram para férias, outras já voltaram, outras partirão...de qualquer modo, em Agosto, o atelier estará fechado e não poderemos encontrar-nos tão amiúde. Só damos por isso quando de repente, ficamos livres à 3ª e à 5ª, sem ninguém que nos ature :), sem podermos trocar frases dispersas com colegas de ofício, sem haver motivos para rir, nem usar o sentido de humor para fazer rir. Bem sei que só iremos por um mês, mas esse tempo que é de defeso, como se diz no futebol custa um bocado.


Hoje resolvi levar a minha máquina para a Escola e tirei algumas fotos enquanto trabalhávamos , assim como à exposição colectiva que está neste momento a decorrer.
Como vos disse, não gosto muito de ver os quadros todos juntos, assim sem grande nexo, mas às vezes não há outra hipótese de os ver. Convém clicar para aumentarem de tamanho.




Quase todos são figurativos, há um ou outro abstracto. E há alguns que são mesmo excelentes na minha opinião. Não figuram os nomes dos pintores porque não os sei todos, peço desculpa. Há tres turmas diferentes.



A última foto é do Professor Domingos Loureiro , que está a preparar a exposição " Malhas da minha Vida" ( Clube Literário, 16 de Julho- 21 h) com a nossa colega Ana Maria.

Hoje estivémos a ouvir música de Wim Mertens, compositor, vocalista contratenor, pianista belga que tem uma obra impar no género de música minimalista. O atelier não nos enriquece só visualmente. O professor tb nos ensina Musica :)
Gostei tanto que fica aqui um vídeo dele para os apreciadores.

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Tardes serenas

Hoje passei quase todo o dia com os meus dois netos mais velhos. Não levei máquina fotográfica para não atrapalhar, dado que tomar conta de dois mafarricos de 4 e 6 anos parece fácil, mas não é. Ainda levei a minha filha para me ajudar na piscina, dado que o mais novo ainda não sabe nadar e a piscina do Ipanema Park Hotel ( maravilhosa, aqui fica a publicidade)não tem pé , a altura minima é 1,50. Em princípio é para adultos, hóspedes do hotel, mas podem-se comprar cadernetas e por 8 euros ir lá quando se quer, mesmo ao fim de semana. Além de ter sol durante todo o dia, a água é quentinha e não há aulas, nada-se à vontade, sem ninguém quase.
Os meus netos não pagam nada, o que é ainda uma vantagem suplementar. Estar na água com crianças rejuvenesce-nos extraordinariamente. Nunca levamos bola, mas jogamos com uma chinela que não vai ao fundo, os mergulhos, as danças em círculo, as brincadeiras são infinitas. Lembro-me que o meu neto, quando era mais novinho, dizia que ia ao fundo do mar apanhar pérolas para mim...e eu quase acreditava nessa história.
Depois da piscina, pelas 2 fomos almoçar ao self-service do Palácio de Cristal. Muito acessível e agradável, pode-se levar o tabuleiro para fora junto ao lago, onde passeiam pavões arrastando as suas caudas imponentes e grasnando desalmadamente. Porque é que Deus que criou uma ave tão bela, lhe deu voz de vuvuzela?? Nenhum se dignou abrir o seu leque, embora o meu neto tentasse tudo, só faltou pôr-se de joelhos para ele fazer o favor.
O parque de diversões está muito desmazelado, alguns escorregas desmantelados e é pena pois era um dos parques melhores da cidade, com aparelhos muito originais e desafiadores. Mesmo assim, é um local magnífico para se estar sentado, olhando pelos meninos e conversando com outros avós ou pais. Falta-nos a alegria dos parques americanos - que oferecem esguichos de água nos grandes dias de calor - mas tem arvoredo lindissimo e uma vista para o rio ímpar.
Finda a aventura dos baloiços, começou a aventura na biblioteca. Até a exposição vimos, o meu neto gosta muito de exposições, sobretudo de pintura. Esta era de fotografia, muito boa. Não viémos embora sem experimentar um jogo do Harry Potter, que o meu neto descobriu. Era complicado. O mais pequeno quase adormecia em frente ao DVD do Tom &Jerry, mas ia dizendo: o ratinho é muito esperto, Avó!

Foi uma tarde em beleza...assim fossem todos os dias da minha vida...apesar da artrose que me aflige e da ansiedade que por vezes me assola.

( As fotos são do "Google Images" e do "Olhares")

terça-feira, 13 de julho de 2010

EXPOSIÇÂO : CLAUDE MONET ET l'ABSTRACTION- Paris





Uma exposição diferente sobre Monet, que me faria ir a Paris, se pudesse. Trata-se de 47 telas em que a influência de Monet noutros pintores célebres é notória, mormente na pintura abstracta. Deve ser fabulosa.

Transcrevo a apresentação em francês porque penso ser acessívela muitos leitores deste blogue.


L'exposition présente 47 toiles qui montre l'influence de
Monet sur l'évolution de la peinture abstraite de la seconde moitié du XXe siècle. Toutes
sont révélatrices du rôle capital qu'a exercé le peintre, en particulier sur la jeune
génération de l'abstraction américaine et européenne. Des chefs-d'oeuvre de Pollock,
Rothko, Sam Francis, Richter, de Staël, Kandinsky ou encore Zao Wou-Ki sont exposés.



Musée Marmottan Claude Monet


2, rue Louis-Boilly 75016 Paris


FIGARO 13/07/2010

segunda-feira, 12 de julho de 2010

DIA mundial contra o TRABALHO INFANTIL


Quando dava aulas de Inglês no 11º Ano, nas décadas após o 25 de Abril, os programas eram muito virados para os problemas sociais e extremamente limitados em termos culturais. Basta dizer que os 4 temas principais a tratar nesse ano eram: a Revolução Industrial na GB; condições de trabalho; desemprego; imigração. No fundo tudo se resumia ao mesmo tema : trabalho; trabalho; trabalho.
Fiz muitas pesquisas nesse campo, comprei livros e livros sobre os temas principais - romances como os de Alan Sillitoe, que faleceu recentemente, vi filmes que pudessem interessar aos meus alunos, como o Brassed Off ( não me lembro do nome em português, desculpem), um filme muito interessante sobre as minas do Yorkshire e uma banda de mineiros que toca na penúria até ficarem desempregados por ordem de Margaret Thatcher. Também lia a TIME, que trazia artigos actuais sobre as crianças dos países asiáticos e africanos que trabalhavam de sol a sol. Lembro-me de levar para as aulas fotos de crianças das fábricas de tecelagem, limpa-chaminés de seis e sete anos, meninos que acartavam tijolos debaixo de sol tórrido, umas carinhas lindas e olhos expressivos...
Os meus alunos eram jovens bem nutridos, despreocupados e felizes, com os problemas fúteis da adolescência, o desgosto de não terem jeans de marca ou ténis NIKE ou arrufos de namorados.
Devo acrescentar a este meu texto de hoje que sempre achei que os jovens de 14 a 16 anos deviam trabalhar nos tempos livres, mesmo que não ganhassem nada, pois o trabalho é uma experiência e às vezes torna-se mais útil do que muito estudo e leitura. No Reino Unido e nos EUA, todos os alunos têm part-time jobs, holiday jobs, weekend jobs e isso entra no seu currículo.Eu própria monitorizei um grupo de alunos num Work Experience em Northampton e eles gostaram muito. Aqui em Portugal, grande parte dos jovens acha-se com direito a tudo, bolsas do Estado, livros de graça, universidade à borla, tudo pago pelos Pais. Nunca sentiram na pele a necessidade de custear as suas despesas de educação.Não são todos, graças a Deus.
Para essas aulas a minha filha gravou em tempos um poema lindíssimo de William Blake: The chimney sweeper. Fê-lo para uma cassete e não em CD, de modo que não o posso colocar aqui. Em fundo pôs música de Ennio Morricone. Cada vez que os meus alunos ouviam aquela gravação, ficavam petrificados e comovidos. Eu também.

Oiçam esta versão maravilhosa que encontrei no You Tube:


When my mother died I was very young,
And my father sold me while yet my tongue
Could scarcely cry 'weep! 'weep! 'weep! 'weep!
So your chimneys I sweep, and in soot I sleep.

There's little Tom Dacre, who cried when his head,
That curled like a lamb's back, was shaved: so I said,
"Hush, Tom! never mind it, for when your head's bare,
You know that the soot cannot spoil your white hair."

And so he was quiet; and that very night,
As Tom was a-sleeping, he had such a sight, -
That thousands of sweepers, Dick, Joe, Ned, and Jack,
Were all of them locked up in coffins of black.

And by came an angel who had a bright key,
And he opened the coffins and set them all free;
Then down a green plain leaping, laughing, they run,
And wash in a river, and shine in the sun.

Then naked and white, all their bags left behind,
They rise upon clouds and sport in the wind;
And the angel told Tom, if he'd be a good boy,
He'd have God for his father, and never want joy.

And so Tom awoke; and we rose in the dark,
And got with our bags and our brushes to work.
Though the morning was cold, Tom was happy and warm;
So if all do their duty they need not fear harm.



William Blake » Songs of Innocence-The Chimney Sweeper

Tradução:

O LIMPADOR DE CHAMINÉS

Tradução ( brasileira) de Renatta Suttana



Eu era bem novo, e minha mãe morria; e meu pai vendeu-me quando eu mal sabia balbuciar, chorando: “’dor! ‘dor! ‘dor! ‘dor! ‘dor!” Assim, sujo e escuro, sou o limpador.
Aquele é Tom Dracre, que chorou na vez em que lhe rasparam a cabeça: “Vês – consolei-o – Tom, que é bom não ter cabelo, pois assim fuligem não te suja o pêlo.”
Assim se acalmou, e numa noite escura Tom, dormindo, teve esta visão futura: que mil limpadores – josés e joões – foram confinados em negros caixões.
E então veio um Anjo, com uma chave branca, e os tirou do escuro, destravando a tranca; e então, entre risos, ao campo saíram, no rio lavaram-se, e ao sol reluziram.
Sem sacos às costas, despida a camisa, voaram nas nuvens, brincaram na brisa; disse o Anjo a Tom que, se fosse bonzinho, Deus feliz tomava-o como seu filhinho.
E, após, despertando, foi na escuridão apanhar seu saco mais seu esfregão, e saiu alegre na manhã gelada. Quem seu dever cumpre não receia nada.


Não gosto de ser demagógica, mas tinha de fazer sentir o problema aos meus alunos, embora a minha missão fosse ensinar-lhes inglês, afinal....e somente.

domingo, 11 de julho de 2010

Novo quadro



Ontem terminei uma pintura que já tinha iniciado no atelier. É parecido com outro recente, mas para mim está muito mais bonito, com cambiantes de cor quentes que me agradam profundamente. A minha sala tem pouca luz no Verão por causa da varanda - o sol passa alto - e de noite é que os quadros adquirem luminosidade nas paredes onde estão colocados.
Tirei ontem umas fotos para guardar no meu folder, que contém todas as pinturas que fiz até hoje , mesmo as que ofereci ou vendi.É engraçado rever algumas que já quase esqueci feitas em guache, aguarela ou pastel. Ultimamente só tenho feito acrílico, embora haja uma promessa remota no atelier de iniciarmos o óleo em Setembro. Espero que sim, não quero estagnar.
O impasto deu a este quadro um relevo que aqui não se nota, mas que é vital, pois provoca cambiantes de cor muito belos.

Lembra-me o fundo do mar....mas também a terra...

Coaduna-se bem com esta valsa trágica de Berlioz ( Sinfonia Fantástica, 2ºandamento), uma das minhas peças favoritas.


Bom Domingo!