A Regina foi minha colega na Escola Carolina Michaelis e, embora ela leccionasse Física-Química e eu Inglês, a nossa vivência da escola e sobretudo, a nossa carolice e motivação - muito antes desta era socrática - aproximou-nos.
O feitio dela não era muito parecido com o meu. Ela era muito mais interveniente e eu mantinha quase sempre low profile. Ainda me lembro de Conselhos Pedagógicos em que a Regina estava do contra e falava tão depressa que ninguém compreendia o que ela dizia. Mas tinha razão:)
A Regina tem costela transmontana e isso nota-se muito nela. Vivi dois anos em Chaves e sei como eles são, raçudos, inteligentes e sensíveis, pessoas diferentes. Sempre achei extraordinário o seu jeito de mãos, fazia camisolas e casacos lindíssimos em lãs diversas e andava sempre com cachecois, pois tremia de frio nos laboratórios de Física. As joias simples que usava - e que se podem ver na foto acima - eram feitas de objectos que encontrava, conchas, pedaços de pedra, que ela moldava e tornava uma obra unica.
Ficámos amigas. Pura empatia, eu que não tinha muitas amigas na escola, ela que era mais popular, muito admirada, mas bastante reservada. Descobrimos, há dias, que ambas nos aposentámos um pouco pelas mesmas razões - ela com 39 anos de ensino e 22 de orientação de estágio, eu com 37 e 16 de orientação. A Regina, porém, está muitos furos acima, tirou um Mestrado em Educação, trabalhou na Universidade do Porto e recebeu vários prémios, um dos quais o Prémio Rómulo de Carvalho, professor que, por coincidência, o foi do meu irmão Mário no Pedro Nunes e meu colega durante o ano de estágio e, alem do mais, o grande Poeta António Gedeão.
A Regina começou a pintar num atelier, como eu. Mas também publica livros e faz poemas para adultos e para crianças, que eu não faço, nem nunca fiz.
Daí eu querer prestar-lhe esta pequena homenagem, num blogue dedicado às artes divulgando alguns dos seus poemas. Não consegui fazer o upload das pinturas que ela me mandou em word, mas em breve o farei.
Aqui estão:
Silêncio branco
Nos enredos da memória, por entre o silêncio branco,
vão desfilando sombras de mil vozes e penumbras de mil cores,
as palavras não ditas e as reditas, a luz que o orvalho dispersou,
os murmúrios do mar e os sussurros do vento,
o reverso do tempo que eu tento aprisionar
no búzio que a maré aqui deixou.
Andante
Em Agosto, o sol rubro ao poente
antecipando um dia muito quente
e o alegre canto da cigarra
que a morna brisa acalentava,
faziam o poema.
Em Novembro, as cores outonais
das folhas, bailarinas surreais
que caídas no fim do seu tempo
bailavam ao sabor do vento,
faziam o poema.
Em Dezembro, o crepitar da lareira
e o manto branco na ladeira,
emprestando um ar de fantasia
a um natal pleno de magia,
faziam o poema.
Em Maio, o campo com seu ar de festa
exalando um subtil odor a giesta
e o rubro das papoilas nas searas,
contrastando com tímidas flores claras,
faziam o poema.
O poema estava ali,
não precisava de palavras.
Procuro o tempo
Procuro o tempo por detrás do tempo.
Procuro um tempo, linha aberta, não sei se parábola, se recta,
fluindo em direcção ao infinito.
Procuro o tempo por detrás do tempo
mas o que encontro é já um tempo elíptico,
linha fechada, quase circular, veloz, a convergir para o centro
onde não há tempo por detrás do tempo
e já não faz sentido procurar.
Obrigada, Regina!
Daqui a dias, porei aqui os teus livros publicados.