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quarta-feira, 25 de maio de 2011

As flores do Verão

Hoje passei por um jardinzito que fica junto aos prédios da Rua António Cardoso e que, num pedacinho de terra minúsculo, ostenta as mais belas flores que se podem ver nesta época de quase verão. Levava um saco do Pingo Doce, ia cansada, mas tive de pousar tudo e pegar no meu Ipod Touch para eternizar a beleza que ali naquele cantinho da rua chamava por mim.
Não sei quem cuida daquelas plantas, quem as semeou, mas elas ali estão frescas, lindas, combinando os seus vermelhos e o seu perfume. É raro ver flores tão bem tratadas, tão apelativas assim no meio da rua. Dou graças a Deus por ainda existirem e por ninguém as cortar, vandalizar ou pura e simplesmente esquecer.

Ocorreu-me este soneto de Shakespeare, um dos mais bonitos dele, que trasncrevo traduzido e na versão original.

Shall I Compare Thee To A Summer's Day?

by William Shakespeare (1564-1616)


Shall I compare thee to a summer's day?
Thou art more lovely and more temperate.
Rough winds do shake the darling buds of May,
And summer's lease hath all too short a date.
Sometime too hot the eye of heaven shines,
And often is his gold complexion dimm'd;
And every fair from fair sometime declines,
By chance or nature's changing course untrimm'd;
But thy eternal summer shall not fade
Nor lose possession of that fair thou ow'st;
Nor shall Death brag thou wander'st in his shade,
When in eternal lines to time thou grow'st:
So long as men can breathe or eyes can see,
So long lives this, and this gives life to thee.




Comparar-te a um dia de verão?
Há mais ternura em ti, ainda assim:
um maio em flor às mãos do furacão,
o foral do verão que chega ao fim.
Por vezes brilha ardendo o olhar do céu;
outras, desfaz-se a compleição doirada,
perde beleza a beleza; e o que perdeu
vai no acaso, na natureza, em nada.
Mas juro-te que o teu humano verão
será eterno; sempre crescerás
indiferente ao tempo na canção;
e, na canção sem morte, viverás:
Porque o mundo, que vê e que respira,
te verá respirar na minha lira.

William Shakespeare, in "Sonetos"
Tradução de Carlos de Oliveira

quinta-feira, 10 de junho de 2010

DIA de CAMÕES


Estátua do Homem do Leme - Foz do Douro
Quando andava no liceu, tive de estudar os Lusíadas, como todos os alunos que naquela altura frequentavam o ensino oficial. Os Lusíadas tinham o seu quê de tenebroso para uma menina habituada a ler romances - mais do que qualquer outro tipo de leitura - e mesmo esses , escolhidos pela minha Mãe ou irmãs. Era o tempo das Berthe Bernages, das Pearl Bucks , tudo muito soft e construtivo, para não dizer politicamente correcto. Lia muito, muito, mas tudo demasiado optimista e cor de rosa.
Os Lusíadas, ensinados pela minha professora, uma senhora de Trás-os-Montes com cultura para dar e vender, muito formal, mas excelente professora, encantaram-me. Adorava os pequenos episódios entre os deuses, os pedacinhos da História de Portugal que iam surgindo e que ela nos explicava dum modo empolgante, as lutas entre Marte e Vénus...era como um jogo de computador em que havia vencedores e vencidos. Depois havia a sintaxe, os exercícios que fazíamos sobre as frases em que o sujeito e predicado andavam a monte e era preciso uma lupa para os encontrar :)). E onde é que estavam os apostos....e os complementos circunstanciais de lugar e de modo??? Tudo empolgante para mim que adorava literatura. Tirei a melhor nota a Português no exame de 5º ano do meu liceu - 17,4. Fiquei maluca! Queria estudar Românicas, mas não existia essa alínea, só a de Germânicas. Fui estudar Inglês e Alemão. Mas continuei entusiasmada pela Literatura Portuguesa, tendo arrancado um 18, a melhor nota do 7º Ano. Não conto isto por vaidade, mas para mostrar como amava a nossa língua. Em Inglês tive 12 na escrita!!!

Mais do que os Lusíadas, fiquei apaixonada pelos sonetos de Camões. Como é que um homem que escreveu no sec XV, consegue ser actual nos tempo de hoje, para lá da maravilha silábica que segue todas as regras, a rima, e o conteúdo de cada poema!

Quando tinha 9 anos o meu avô meteu na cabeça que nós havíamos de aprender poesias de cor. Éramos seis irmãs e cada uma tinha a sua. A mim coube-me a que se segue. Ainda hoje a tenho na memória e é das que mais gosto:


Sete anos de Pastor
Sete anos de pastor Jacob servia
Labão, pai de Raquel, serrana bela;
Mas não servia ao pai, servia a ela,
Que a ela só por prémio pretendia.

Os dias na esperança de um só dia
Passava, contentando-se com vê-la;
Porém o pai, usando de cautela,
Em lugar de Raquel lhe deu Lia.

Vendo o triste pastor que com enganos
Assim lhe era negada a sua pastora,
Como se a não tivera merecida;

Começou a servir outros sete anos,
Dizendo: − Mais servira, senão fora
Para tão longo amor tão curta a vida.



Hoje acredito no Amor. Já não acredito tanto na perseverança em conseguir realizar os nossos sonhos. Mas um poema não tem de ser real nem pragmático. O Amor existe. E o poeta finge que acredita.