domingo, 28 de março de 2010

Le Dieu du Carnage- O Deus da Matança



Acabei de chegar a casa. Vim do teatro, o que já não acontecia desde que fui a Leeds, no ano passado. Minto: vi O Feiticeiro de OZ, o musical, há meses. Em geral, não vou ao teatro em Portugal e devia penitenciar-me por isso, pois já perdi algumas peças boas - com óptimos actores nacionais.
Há uns dez anos vi uma peça de Yasmina Reza, autora desta peça que fui ver hoje: ART. Vi-a em Londres com tres actores consagrados, entre os quais Albert Finney e Tom Courtenay. A peça ganhou um Olivier, prémio máximo atribuído a peças de teatro no Reino Unido, tendo ganho depois o Tony award, prémio correspondente nos EUA.
Foi uma experiência inesquecível, apesar dos bilhetes terem custado uma fortuna. Voltei a ver a peça em Portugal e comprei o livro que li já das vezes em inglês, embora a peça tenha sido escrita em francês.

A peça de hoje não fica trás de ART em profundidade, conhecimento humano e dramatismo, que se esconde por detrás duma aparente superficialidade nas palavras e nos gestos. Tem humor sarcástico, mais do que ironia. Muito actual, parte duma cena de escola, em que um adolescente agride outro com um pau, partindo-lhe dois dentes, e retrata uma situação perfeitamente plausível aqui ou noutro lado qualquer. Os pais encontram-se para redigir o documento para a seguradora e parece não existir nem rancor, nem ódio, nem desejo de vingança de parte a parte. À medida que a conversa avança - e é nisso que YR é brilhante - o enredo endurece, torna-se cada vez mais denso e surge o humor quase macabro, que envolve todas as personagens, dando à situação um tom de tragicomédia, em que os pormenores mais intimos de cada personagem e as suas relações com os outros se vão revelando gradualmente até à histeria e perda total de razoabilidade de parte a parte.
A imagem que me ficou desta peça é a de uma jarra de túlipas brancas lindíssimas que é atirada de encontro a uma parede, juncando o tapete de flores e de água. É o estertor da aparência, do "verniz", da "civilização", da polidez e da tolerância.
Actores muito razoáveis - diria mesmo, dois óptimos, Sofia Portugal e Sergio Praia, dois talvez menos brilhantes, Joana Seixas e Paulo Pires, num ambiente de agressividade contida ou disfarçada que acaba por explodir. 90m que passam num instante.

Muito Bom. Chorei a rir, o que já não me acontecia há muito...e compreendi porque é que os casos de violência nas escolas existem e continuarão a existir.

A peça acabou hoje com lotações esgotadas no Porto. Vai voltar a Lisboa em Setembro, no Teatro Aberto. Se não viram, aproveitem porque é realmente a não perder.

Fica aqui um vídeo com uma entrevista ao encenador, João Lourenço e aos actores.