sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Jardim Botânico - Porto







O Jardim Botânico do Porto, hoje parte integrante da Faculdade de Ciências, foi em tempos uma quinta senhorial, pertencente à família Andresen, que gerou dois vultos da nossa literatura: Sophia Mello Breyner e Ruben A.
Ambos se referem a este jardim e esta mansão nas suas obras. Sophia inventou um conto para crianças, A Floresta, inspirando-se num velho carvalho, onde viviam anões mágicos.

Era uma vez uma quinta toda cercada de muros.
Tinha arvoredos maravilhosos e antigos, lagos, fontes, jardins pomares, bosques, campos, e um grande parque seguido por um pinhal que avançava quase até ao mar.
A quinta ficava nos arredores de uma cidade. O seu pesado portão era de ferro forjado pintado de verde. Quem entrava via logo uma casa grande rodeada de tílias altíssimas cujas folhas, de um lado verdes e de outro lado quase brancas, palpitavam na brisa.
- A Floresta

Ruben A. dedica quase todo o primeiro volume de "O Mundo à minha procura", a sua autobiografia, à descrição da infância e adolescência passadas nessa quinta sem fim, com árvores altas e flores magníficas. O átrio da casa era o local escolhido para uma gigantesca árvore de Natal, que os Andresen, nórdicos de origem, não dispensavam.

"Voltar ao Campo Alegre foi para mim qualquer coisa de enorme na vida, mais importante do que ir à Lua, ou andar em órbita à volta da Terra."

"O átrio do Campo Alegre é célebre, coisa de embasbacar. É um perfeito quadrado erguendo-se livre até vinte metros ou mais, tendo do primeiro andar (a casa só conta o piso térreo e o primeiro andar, não mencionando as caves) uma enorme varanda quadrada que se debruça sobre o átrio e que serve todos os quartos na parte virada à luz. Lá no cimo, no cocuruto, estava uma forma de clarabóia, com varandim circular, de onde nós no Carnaval atirávamos serpentinas à cabeça de quem obrigatoriamente passava lá por baixo. No entanto, a grandeza do átrio mostrava-se, além da sua maravilhosa perspectiva de simetria, no andar nobre da casa que era o andar da entrada, ultrapassada a curta escadaria exterior. O átrio do Campo Alegre apresentava o mercado da casa, o lugar de reunião, a ágora grega onde as pessoas vinham falar e discutiam os assuntos mais variados, onde cada um que saísse dos seus quartos estava imediatamente debaixo da alçada visual de um estranho ou de um desconhecido. Era a praça pública íntima dos familiares, lugar de suspiros ao chegar a casa e onde se dizia adeus pelo eco daqueles trinta metros acima que fazia ressoar a voz humana com um sentido correcto de simetria. As condições acústicas surgiam musicais. O mínimo som denunciava a presença de alguém, a mais íntima declaração amorosa estendia-se em pequenos timbres pelas colunas que suportavam a álea de quartos da casa.» O Mundo à Minha Procura I.






Moro em fente do Jardim Botânico e não há dia em que não passe em frente ao portão e não pense nessas duas figuras que já partiram. Entro por vezes e vou directa ao meu local preferido: o lago de nenúfares, que reflecte toda a vegetação à volta, nos vários cambiantes e estações do ano. Mas também já estive lá em cima no cocruto, num Domingo em que o Sr. Guarda nos levou a ver o jardim do alto da mansão. Pura simpatia.

A minha paixão pela fotografia já me levou a tirar mais de cem fotos deste jardim....
Hoje resolvi pintá-lo. Não pensei em Monet, mas no lago que vejo quase todos os dias.
Foi isto que pintei:



Guache e acrílico sobre papel