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sábado, 20 de agosto de 2011

Angústia de verão

Raras vezes conseguia descansar muito nas férias de verão.

O mês de Agosto então era um sufoco sem empregada, com as crianças em casa todo o dia, sem carro pois nunca conduzi, numa cidade quente e com poucos espaços verdes, sem nenhuma ajuda do meu ex-ou da família.
Detestava o mês de Agosto, mesmo quando íamos para a Luz, sentia um enorme cansaço, os dias eram intermináveis, o descanso relativo e só os banhos de mar, a evasão na praia ou alguma música me davam conforto.
Mesmo assim, acabava sempre as férias em depressão, desejosa de começar as aulas, de ver os novos alunos, pegar nos livros, preparar tudo e enfrentar o ano lectivo com entusiasmo, sabendo que os filhos voltavam para o infantário ou para o colégio e não estavam comigo full time. Não fui uma má mãe, creio eu, mas nunca achei que fosse possível educar três filhos praticamente sozinha e ainda fazer tudo em casa. Nunca tive desejos de ser fada do lar e fui-o muitas vezes, vezes demais, até que os filhos cresceram e começaram a ser independentes e aí comecei a respirar um pouco.
Nessa altura, pelos anos 80, dediquei-me ao trabalho até à exaustão, trabalhando em três ou quatro coisas simultaneamente, produzindo manuais escolares todos os anos durante as férias, dando aulas particulares, fazendo sessões para professores, procurando ser melhor profissional que nunca. Tenho a consciência de que fui sempre uma professora motivada e os meus alunos gostavam das aulas e de aprender inglês. Também adorei alguns anos de estágio,em que arranjei verdadeiras amigas nas jovens que queriam ser docentes e ainda não tinham experimentado dar aulas. Os agostos passaram a ser mais trabalho....

Este ano tive as minhas férias cedo demais - pode-se dizer que vivo em férias permanentes, mas não é bem assim - as férias só o são a sério quando se sai de casa ou quando se antevê uma perspectiva de fuga breve. Sem isso, tornam-se uma obrigação, uma sucessão de tarefas chatas, uma monotonia.
O que nos dava prazer -o  tempo livre - passa a ser um fardo. E vemos o tempo a fugir, queremos fazer coisas, mas já não temos coragem para encetar um programa de divertimento e distracção à nossa medida. Vivemos para os outros, em função dos outros. Isso deprime-nos. E a eles também.

Hoje senti isso vivamente...passei o dia deprimida...fiz uma colagem do Porto, pintei um quadro que está secar e até as próprias cores da foto e do quadro reflectem angústia...

Amanhã tenho de sair, talvez vá a Serralves ou ao parque da cidade....talvez ao cinema...não posso é ficar em casa a pensar no passado e a angustiar-me com o futuro.

domingo, 5 de dezembro de 2010

De Goa para Lisboa...aos 14 anos



Faz hoje trinta anos que o meu Pai faleceu. Depois de um AVC em Junho, em que ficou incapacitado parcialmente, os seis meses que se seguiram foram penosos para a família, que o vira sempre tão dinâmico, esperançoso, feliz com os seus numerosos netos, que já eram 13 ao todo ( hoje são 21). Na altura já eu vivia no Porto e tinha tido o meu filho mais novo tres semanas antes. Nunca chegou a conhece-lo.



O meu Pai foi único, não digo no sentido melhor ou pior, mas pessoas como ele não existem muitas. Nasceu em Goa. Aos 14 anos, seus pais, meus Avós, enviaram-no para Lisboa, num navio a cargo do capitão, para estudar na capital do Império, que ficava a um mês de distância. Era o filho mais velho de oito irmãos, inteligente, deveria preparar-se melhor para uma carreira futura. O seu tio Padre o acolheria e ajudaria a formar-se. Depois de terminado o curso voltaria para Goa.

Aos 21 anos o meu Pai terminou o curso de Medicina e foi convidado para Assistente do Professor Castro Freire, pediatra, a título gracioso. Trabalhou então em policlínicas para se sustentar. Aos 28 casou com a minha Mãe e só voltou a Goa em visita 35 anos depois de ter chegado. A vida de médico pediatra e de professor, a família numerosa, e talvez um certo receio de regressar às origens, fizeram com que se enraizasse em Lisboa para sempre. Mas, nem o meu Pai, nem a minha Mãe, também ela filha de um goês, eram tipicamente portugueses, tinham um espírito aberto, internacional, que nos abriu horizontes muito para lá do pequeno país onde vivemos. Frequentámos um colégio inglês o que ainda aumentou mais a nossa "internacionalização".
Admiro muito o meu Pai, embora sempre lhe visse alguns defeitos, que na altura não compreendia, mas agora percebo claramente. A sua exigência, uma certa dificuldade em ceder, intransigência e reserva eram apenas uma capa, no fundo preocupava-se connosco e emocionava-se com os nossos sucessos. Ensinou-me muito a nível de apreciação da música, da arte, da natureza e dos valores familiares. Foi um exemplo como Homem, Marido e Pai.
Faleceu cedo demais. Tinha 68 anos. Poderia ter gozado mais trinta anos, reformado, com os netos e bisnetos, fazendo as suas viagens com a minha Mãe que ele adorava.
Estive cinco anos fora de tudo, na província e vi-o menos do que gostaria. Mas mesmo assim, nunca esquecerei a última vez que o vi aqui no Porto, à porta da casa da minha sogra, com a sua gabardine beige, ansioso por me ver, com duas prendinhas para os meus filhos mais velhos. Vinha para um congresso e no hotel, mostrou-me, orgulhoso, os slides que fizera para a sessão, desejei-lhe boa sorte. Nunca mais o vi assim.

Eis aqui a homenagem modesta que lhe que posso fazer aqui no meu blogue, Pai.
Como diz o seu filho mais novo, os Pais devem estar algures na Eternidade, a olhar para os vossos 21 netos e trinta bisnetos, com um sorriso de felicidade.
Até sempre!